Ouvi dizer que o amor faz cócegas na rotina.
A rotina é isso de andar pelo mesmo lado da rua,
acordar com o mesmo horário despertando no celular, lavar primeiro o cabelo,
passar sabonete enquanto o condicionador age das pontas para cima, nos fios todos. acordo com minutos trocados, cada dia um minuto depois, dois dias depois, três minutos antes. finjo uma finta na rotina criando outra rotina.
Ouvi dizer que o amor sobe escadas de dois em dois degraus.
Falta o ar e reaparece a cada nova pisada, parada, pisada, parada.
O nariz respira com a ajuda da boca.
A água é para quando se sentar em frente à geladeira. Não tomo água,
misturo o suco em pó ou espremo laranjas.
Ouvi dizer que o amor assobia um blues quando volta pra casa, sózinho.
É a voz da negona aos berros ou o grandão que parece descosturar
os pontos colocados sobre a ferida,
que faz o coração se reconhecer um pouco mais do que bolsa de sangue fervendo.
Solto por aí, chutando latas vazias, olhando para o chão, lembrando do céu imenso,
solto por aí, cutucando a solidão imperativa.
*Juliana Gola - Formada em jornalismo, ama a literatura com respingos de cinema, música e das mais inusitadas formas de expressão. A não-expressão corre junto. Escrever foi só um jeito que ela descobriu de não sufocar, o resto é cotidiano.
(Enviado pela colaboradora Paloma Aimée Ferreira)