Quando o sol não havia ainda cessado o brilho, quando a tarde engolia aos poucos as cores do dia e despejava sobre a terra os seus primeiros retalhos de sombra,
eu vi que Deus veio assentar-se perto do fogão de lenha da minha casa.
Chegou sem alarde, retirou o chapéu da cabeça e
buscou um copo de água num pote de barro que ficava num lugar de sombra constante.
Ele tinha feições de um homem feliz.
Parecia imerso na alegria que é própria de quem cumpriu a sina do dia e
que agora recolhe a alegria cotidiana que lhe cabe.
E olhava e pensava:
‘Como é bom ter Deus dentro de casa.
Como é bom chegar a essa hora da vida em que tenho o direito de ter um Deus só pra mim’.
Cair nos seus braços, passar as mãos nos cabelos,
retirar uma caneta do meu bolso e
pedir que ele completasse as palavras cruzadas do jornal "A Tarde".
Mas aquele homem não era Deus, aquele homem era meu pai.
E assim que eu descobri que meu pai, com seu jeito finito de ser Deus,
revela-me Deus com seu jeito infinito de ser homem.
(Foto Nilton da Silva)