domingo, 5 de maio de 2013

NÃO CONTA PRA NINGUÉM (AILIN ALEIXO)

Todo mundo tem segredos. Ou pelos menos as pessoas interessantes.
Nada mais chato que alguém mapeado, retilíneo, constante, bonzinho, doce, amável. Para mim, só vale a pena quem tem um cadáver no armário, uma sombra perigosa,
um poço fundo. Pessoas simplórias são como muitos dias de sol seguidos:
agradáveis e infinitamente entediantes.

É a falta de obviedade desperta a curiosidade.
Não é à toa que os mitos nascem da dualidade,
da pouca incidência de clareza sobre sua personalidade:
ninguém fica embasbacado pela simplicidade do seu Zé da quitanda
(no máximo, enternecido). Somos fascinados pelo que não entendemos,
amamos o desconhecido - por isso mergulha-se à noite, escala-se o Himalaia,
come-se fora de casa, trai-se.
É só quando ultrapassamos a barreira do familiar, do seguro,
que nos tornamos verdadeiramente pessoas. Menos ingênuas, é certo, mas completas.
Ter segredos é viver intensamente,
é a prova de que a realidade é muito mais do que nossos forçados sorrisos de bom dia,
o escritório claustrofóbico, o saldo negativo.
Ter segredos é ter coragem de arcar com o peso de ser único.
Porque quem não se arrisca, não faz besteira, não vive:
apenas gasta o tempo que deveria ser aproveitado apaixonadamente.
Apenas caminha sobre os dias rumo à morte.