Olhar sobre paredes enquanto se sobe ou desce a escada rolante do Aeroporto de Miami (EUA) passou a ser uma ação que viajante nenhum, deverá deixar de fazer. É que dois murais – de 15,5 x 5,5 m –, pintados por *Hector Paride Bernabó, Carybé (1911-1997), em 1960, foram dispostos ali, um de cada lado. O movimento uniforme e intermitente das escadas permite um efeito como se fosse um “travelling”, e facilita a fruição porque aproxima o observador, que poderá ver com detalhes as figuras que povoam o universo do artista.
As obras foram instaladas no Aeroporto de Miami porque, há dois anos, a Odebrecht soube, por meio de uma baiana, que as pinturas poderiam ser demolidas junto com a ala em que estavam fixadas no Aeroporto John Kennedy, em Nova York. A empresa promoveu a retirada, a restauração e transferência dos painéis. Dia 25 de junho passado, as peças, que simbolizam a história e a cultura dos Estados Unidos, foram redescobertas numa recepção com autoridades, executivos da empresa e familiares do artista. Os murais "Alegria e Festa das Américas" e "A Descoberta do Oeste", foram pintados e instalados por Carybé há 50 anos, depois de ganharem o primeiro e o segundo lugar em um concurso promovido pela American Airlines para escolha de trabalhos para decorar o setor que a companhia ocupava no Aeroporto de Nova York.
Em 2007, antes de uma reforma começar a ser feita, a baiana Beatrice Esteve, voltava para o Brasil. O carregador de malas Darren Hoggard comentou que aquelas obras de artista seriam destruídas por causa da reforma. Darren arriou as malas de Beatrice no chão e os dois selaram o compromisso de encontrar um jeito de preservar as obras. E seguiram para os balcões da American Airlines, mas logo viram que nada seria encaminhado por ali. Ao chegar a São Paulo, Beatrice contatou o Conselho de Administração da Odebrecht, desencadeou uma operação emergencial. Isto porque as telas tinham sido pintadas diretamente na parede e esse aspecto significava que dificilmente poderiam ser apartadas. Ninguém sabia como se poderia retirar as pinturas sem danificá-las, tampouco onde recolocá-las.
Pensou-se em mandar as peças para a Bahia, o mais sensato foi depositá-las em galpões no Bronx, para restauração. Em dezembro, em um inóspito aeroporto em processo de demolição, sem energia para iluminação ou calefação, os restauradores tiveram que trabalhar em ritmo acelerado. Retiraram a parede dividindo cada obra em seis pedaços de 1 tonelada cada, que foram acomodados em berços separados construídos especialmente para eles. Qualquer erro poderia significar destruição irreparável. Carybé construiu e instalou os imensos painéis sozinho e de forma a permitir a remoção, construiu uma parede de quatro centímentros de espessura com dois centímetros de espaço vazio atrás, e assim criou possibilidades para que os painéis fossem retirados. Os detalhes do trabalho foram divididos em quatro fases: retirada da parede, restauração, viagem de caminhão de Nova York a Miami, e a colocação dos painéis
nas paredes do aeroporto de Miami.
"Discovery and Settlement of the West"
Os estilos variados da arte de Carybé refletem o sabor das diversas etnias da cidade, como a rica cultura de Miami. Sua arte de cores vibrantes, cultura rica e tradições místicas da Bahia.
"Rejoicing and Festival of the Americas"
A celebração da vida e o respeito à diversidade cultural compartilhadas entre Carybé e a comunidade de Miami, fazendo do Aeroporto de Miami lugar perfeito para seus murais.
(Jornal "A Tarde" de 28 de junho de 2009 )
*Hector Julio Páride Bernabó ou Carybé foi pintor, gravador, desenhista, ilustrador, ceramista, escultor, muralista, pesquisador, historiador e jornalista argentino naturalizado e radicado no Brasil.